quarta-feira, 28 de julho de 2010

A ROSA E A BORBOLETA


Finalmente seu pai havia acabado mais um quadro. Estava ansioso para ver o que ele pintara. Era sempre assim, gostava de ficar no atelier vendo aqueles quadros, imaginando a história de cada um e quando o pai deixava, lambuzava alguma tela com tinta também, mas somente enquanto esperava-o terminar suas obras de arte.

Gostava de quase todos. Algumas pinturas ele não entendia, outros eram muitíssimo lindos, e sempre que o pai entrava ali, corria para ver como seria a mais nova preciosidade que nasceria daquelas mãos que com tanto carinho, muitas vezes lhe abraçava e que com o mesmo sentimento acariciava aquelas telas.

Mas naquele momento, lá estava ele, pendurado na parede, o mais novo quadro, recém saído da sensibilidade de seu jovem pai, perto da janela. A tinta ainda fresca, não impedia que a beleza contida na tela fosse admirada. Seu pai com um olhar sereno caminhou em sua direção, como que perguntando: “Gostou?”, e em silêncio deu-lhe um beijo nas bochechas saindo em seguida, deixando-o sozinho no atelier.

Como em estado de hipnose, Ele ficou, ali, parado, quieto, em silêncio, apenas contemplando a bela rosa branca, delicadamente pintada naquele quadro. Era uma rosa feita de papel de cartas. Cada pétala era uma carta e muito provavelmente, cartas de amor de algum romântico apaixonado. O que estaria escrito naquelas pétalas? Poemas, declarações de amor, carta de despedida, não sabia. Sabia apenas que era uma singela flor e que estava sozinha naquele quadro, solitária em seus segredos, silenciosa em suas pétalas, a espera somente de um lugar ideal para desabrochar na imaginação daqueles que a contemplariam.

De repente o vento de final de tarde soprou suave invadindo o ambiente pela janela, balançando a cortina, trazendo em sua companhia uma pequena borboleta, que com toda a beleza de seu vôo, vasculhou cada canto daquele pequeno cômodo, como que escolhendo um lugar para sossegar as suas asas.

Ele, o menino, apenas acompanhava com os olhos o belo voo da borboleta, tentando adivinhar onde ela iria pousar, e num estalo, imaginou como aquela rosa solitária ficaria feliz com a companhia de uma borboleta pintada ao seu lado no quadro, com quem, assim, poderia compartilhar os seus segredos de amor. Correu então para falar com seu pai e pedir-lhe que fizesse conforme imaginara.

Porém quando voltou ao atelier, quão grande surpresa ambos tiveram, pois com uma nova lufada, o vento suavemente empurrou a borboleta que, com sua fragilidade, se deixou vencer pela força do vento e pelas artimanhas do destino, acabando assim, presa na tinta fresca, ao lado da rosa e livre na ingênua imaginação do menino.

terça-feira, 27 de julho de 2010

NO CAMINHO DO POETA

No caminho do poeta há sempre uma poesia,
Numa imagem que ficou gravada na memória,
Na história de alguém que acha que não tem história,
Em alguém que só deseja ser ouvido,
Em alguém que mesmo mudo pode falar com o olhar,
Em alguém que necessita de um verso simples para descomplicar a vida,
Em cenas que aos outros passam despercebidas,
Em olhares que se cruzam e não conseguem se enxergar,
Em palavras que se propagam no vazio
E se alojam no coração do poeta,
Na letra de uma canção que ninguém nunca cantou,
Nas palavras de quem está apaixonado
Ou no silêncio de quem nunca amou.

No caminho do poeta há sempre uma poesia,
Pois sempre há um fato pra ser contado,
Um ato inconsistente para ser percebido,
Uma lição de vida para se aprender e ser praticada
Mas que parecem tão banais em meio à correria que é
O nosso cotidiano, a nossa realidade,
Há sempre regras para serem discutidas,
Há sempre normas para serem cumpridas,
E ordens que somente desordenam a vida.

No caminho do poeta há sempre uma poesia,
Há sempre barreiras para se ultrapassar,
Há sempre experiências que mostram ao poeta
Que na vida há coisas que não se pode mudar
Pois a segunda-feira só chega após cada domingo,
O sol só dá seu espetáculo quando estamos dormindo,
Da amizade ao amor basta apenas um beijo,
Um simples gesto pode atrair mil desejos,
A flor só desabrocha na estação certa,
A brisa só entra se a janela estiver aberta,
Mas vale uma sincera lágrima que um falso sorriso,
Todos somos réus do nosso próprio juízo,
A morte só chega quando nossa missão se completa,
E a vida só vira verso no caminho do poeta.